O VEREADOR E O BARBEIRO



O vereador, barriga enorme, cabelos negros de tinta, camisa branca com manchas de gordura, pediu para falar, pegou o microfone, pigarreou e mandou ver com sua voz de locutor de rádio:

- Caros colegas... Ilustres colegas... Excelentíssimos colegas... 

Sentado bem no fundo da plateia, o barbeiro daquela cidadezinha esquecida pelo progresso, o barbeiro que conhecia todos os fios de cabelo, todas as rugas e poros das peles que sua navalha roçava aparando barbas e bigodes, o pequenino barbeiro que ouvia de tudo daqueles homens cansados, insensatos, medrosos, avaros ou boquirrotos, o invisível barbeiro que conhecia segredos e sigilos e desejos daquele povo que ficava à sua disposição horas e horas, dias e dias, o calado barbeiro que fazia das sessões da Câmara Municipal a sua diversão semanal, coçou a cabeça, virou-se para o lado - onde não havia ninguém - e a ninguém confidenciou:

- Faz pose aqui, em casa é frouxo. E leva chifre da mulher.

E então se acomodou na cadeira. E continuou calado, rindo por dentro.

Nenhum comentário: