Deixem a floresta queimar o fogo mais rubro,
o fogo mais alto e o fogo mais estrondoso;
que as chamas espalhem o terror por todas
as criaturas rastejantes, os pequenos seres alados,
os ínfimos e invisíveis operários do solo;
que a fumaça asfixie e afogue pulmões
e o calor seja tal que a pele se desprenda
e todo tecido vivo enegreça, carbonize
e vire pó - porque ao pó retornaremos.
Que importa que o ar fique irrespirável,
que o sol desapareça ao meio-dia,
ou que os hospitais se entupam de
cadáveres ambulantes, zumbis de casacas,
damas da sociedade com roupas de grife?
Há remédios de sobra para todos eles.
Por isso deixem a floresta arder até a última agonia,
porque os tamanduás embandeirados,
os macacos saltitantes, as araras coloridas,
os jacarés preguiçosos e os lagartos sonolentos
não são como a gente, não sabem explicar
as razões de terem nascido sem voz,
sem que possam ao menos pedir socorro,
e não entendam que o fogo purifica,
redime os pecados e eleva a alma aos céus.
O último desses seres sem importância
será o nosso legado, o nosso orgulho e a nossa vergonha.
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