Pobre diabo

Foi importante no tempo em que a indústria têxtil era forte na cidade. Chegou a ser gerente de várias fábricas e nessa época ganhou o apelido com que ficou conhecido: Diabo. Mas da mesma forma que as tecelagens foram sumindo, ele foi se apagando, caindo, se tornando apenas uma lembrança de antigamente. Alcóolatra, passava semanas bebendo sem parar tudo o que podia, emprestando dinheiro de todos os conhecidos. Depois sumia uns dias. Quando reaparecia, estava com a barba feita, a roupa limpa. Jurava que nunca mais ia beber. Ninguém acreditava.
Poucas vezes - e para poucos - contou a sua história verdadeira. Preferia a lenda. O gerente mandão, capataz inflexível que anotava num caderno até os dias em que as empregadas ficavam menstruadas. Um sujeito tão mau que chegou a se vestir de diabo, com roupa vermelha e rabo, para assustar as pobres coitadas que pensavam em fazer uma greve.
– Histórias bobas. Tudo mentira. Me deram o apelido simplesmente porque tinham inveja de mim. Eu gostava de fazer as coisas certas, não permitia liberdades comigo no trabalho. Quiseram me ofender e eu virei o Diabo.
E ficava com a expressão perdida, o olhar distante, os braços pendidos...
– Rapaz, eu não estou mais aguentando. Preciso tomar alguma coisa. Me empresta um dinheirinho, quando eu receber a aposentadoria eu acerto com você...
E lá ia ele, sem chifres, sem rabo. Apenas um pobre diabo.

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